12/01/2021

A CVM, os crimes financeiros e a prevenção à lavagem de dinheiro

12/01/2021

 

Para encerrar o ano, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) divulgou o seu Relatório de Atividade Sancionadora em que constam os dados dos indícios de crimes financeiros ocorridos entre janeiro e setembro de 2020. A autarquia concluiu que as pirâmides financeiras figuraram como crimes mais frequentes no ano passado. Das 260 comunicações feitas pelos Ministérios Públicos Estaduais e Federal, 139 alertas – ou 53,5% – envolviam a prática.

Além das pirâmides, foram listados como crimes financeiros os casos de intermediação sem autorização, de ofertas de valores mobiliários sem registro e os casos com indício de estelionato. A análise da série histórica indica o crescimento do número de comunicações sobre crimes financeiros. Em 2019, a CVM enviou 184 ofícios para os Ministérios Públicos. Em 2018, foram 130. Nos anos anteriores, 121 (2017), 93 (2016) e 76 (2015).

Proibidas no Brasil, as pirâmides financeiras são “vendidas” como um negócio super lucrativo com promessa de retorno garantido. São frequentemente utilizadas por criminosos para fazer a lavagem de dinheiro. Em agosto de 2020, a Polícia deflagrou um esquema sofisticado de lavagem de dinheiro envolvendo a facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), uma corretora de criptomoedas e um esquema de pirâmide financeira utilizando bitcoin.

 

CVM 617 e os avanços em PLD-FT

 

A Instrução CVM 617 entrou em vigor em 1/10/2020 e trouxe aprimoramentos significativos nos processos de prevenção à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo (PLDFT). Para esclarecer os principais pontos a serem cumpridos pelos participantes do mercado e orientar sobre as melhores práticas, a CVM emitiu em dezembro do ano passado o Ofício Circular CVM/SMI/SIN 04/2020. 

O principal objetivo da Instrução CVM 617 é modernizar a regulação do mercado de valores mobiliários sobre a lavagem de dinheiro e o financiamento do terrorismo, alinhando as normas às diretrizes dos principais organismos internacionais, em especial o Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo (GAFI).

O impacto mais significativo da Instrução foi a indicação da adoção de uma “abordagem baseada em risco” como principal ferramenta de combate à lavagem de dinheiro. Na prática, os agentes regulados pela CVM deverão estruturar uma Política de PLD-FT, elaborar a sua avaliação interna de risco e reformular suas regras, procedimentos e controles internos.

A utilização de uma abordagem baseada em risco para combate a esses crimes significa que, em conformidade com regras, procedimentos e controles internos previamente estabelecidos, quanto maior for o risco de LD-FT, maior deverá ser a diligência, controle e monitoramento feitos pelo agente regulado relativamente a tais clientes ou operações.

Outra mudança indicada pela nova norma está relacionada à condução da política “Conheça seu Cliente”, que deverá seguir as seguintes etapas:

– identificação do cliente, com objetivo de assegurar o conhecimento de sua real identidade;

– verificação contínua das informações cadastrais, proporcionalmente ao risco de utilização dos serviços e produtos para a lavagem de dinheiro;

– condução de diligências devidas; 

– processo de identificação do beneficiário final da transação.

 

Os aprimoramentos nos processos de PLD-FT

 

Pouco tempo depois da entrada em vigor da instrução CVM 617, as Superintendências de Relações com o Mercado e Intermediários (SMI) e de Relações com Investidores Institucionais (SIN) da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) emitiram um ofício circular com novas orientações e esclarecimentos. 

De acordo com Francisco José Bastos e Daniel Maeda, Superintendentes da SMI e da SIN, o principal objetivo com o ofício circular é orientar de maneira clara e objetiva como as instituições devem atuar, estabelecendo práticas corretas e cuidadosas, a fim de evitar e mitigar riscos inerentes a que o mercado de valores mobiliários está sujeito, no que se refere às ações de LDFT, sem deixar de atender ao melhor interesse do cliente. 

As áreas técnicas demonstram que itens foram aperfeiçoados e como os regulados devem atuar de acordo com cada um deles. 

 

Abordagem Baseada em Risco: identificar, analisar e compreender os riscos de LD-FT dos respectivos clientes, produtos, serviços, canais de distribuição e prestadores de serviços relevantes, para posteriormente segmentá-los minimamente em baixo, médio e alto.

 

Política Conheça seu Cliente: além do processo de identificação e de coleta de dados cadastrais dos clientes, foram determinadas diligências contínuas, a fim de coletar informações suplementares e, em especial, de identificar seus respectivos beneficiários finais.

 

Cliente e Investidor: a nova norma adaptou o conceito de cliente com a de investidor mantendo o entendimento da Instrução CVM 505 e esclarecendo, para os exclusivos efeitos de PLD-FT, o alcance mais limitado (espécie) do conceito de cliente e mais amplo (gênero) do conceito de investidor.

    – cliente: investidor que mantém relacionamento comercial direto com as pessoas mencionadas no art. 3º da Instrução CVM 617.

    – investidor: pessoa natural ou jurídica, fundo ou veículo de investimento coletivo ou o investidor não residente em nome do qual são efetuadas operações com valores mobiliários.

 

Fundos de Investimento: o distribuidor será o prestador de serviços que manterá relação comercial direta com o cotista, sendo que é sua responsabilidade a coleta das informações cadastrais, a manutenção do cadastro e a adoção das diligências previstas em sua Política de PLD-FT para controlar e monitorar o risco de PLD-FT no que tange às suas atividades.

 

Atualização Cadastral: a Política de PLD-FT precisa necessariamente tratar, dentre outros pontos, da definição dos critérios e periodicidade para atualização dos cadastros dos clientes ativos, de acordo com o art. 11 da Instrução CVM 617, observando o intervalo máximo de cinco anos.

 

Sistema Alternativo de Cadastro: é facultado a todos os participantes e sua implementação não é mais pendente de autorização da CVM. Porém, deve estar devidamente previsto em sua Política de PLD-FT, com as evidências de sua implementação acessíveis à SMI e à SIN, bem como ao autorregulador.

Sobre o Bloqueio de Contas: o ponto abordado na instrução está relacionado com o não aumento de exposição a risco do cliente. Ou seja, o que se espera é que um cliente com conta bloqueada opere unicamente para reduzir ou mesmo para “zerar” a sua posição, hipóteses de pedidos de encerramento de conta ou de alienação ou resgate de ativos.