08/03/2019

A situação atual do Brasil junto ao Gafi – parte 3

08/03/2019

Nesta terceira parte da entrevista, gravada na sede do IPLD, o Prof. Dr. Jorge Lasmar e Bernardo Mota, chefe de Gabinete e Assuntos Internacionais do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), explicam questões relacionadas ao Projeto de Lei 10.431, de 2018, que tramita no Congresso Nacional. Eles comentam sobre a importância de sua aprovação para corrigir deficiências da Lei 13.170, apontadas pelo GAFI (Grupo de Ação Financeira Internacional).

Confira a seguir, a terceira parte desta entrevista.

 

IPLDPor que o governo brasileiro ainda não adotou as exigências em relação à celeridade das ações de indisponibilidade de bens, direitos ou valores, conforme determinam as resoluções do Conselho de Segurança da ONU?

Bernardo Mota: Eu poderia dizer o seguinte, nós estamos no começo de um novo governo. Então, acho que precisamos fazer alguns cortes. O Gafi já vem apontando deficiências no Brasil, em relação, talvez, às medidas de congelamento, desde 2010. Nós damos o primeiro passo, posso dizer assim, em 2015, com a Lei 13.170. A Lei, o Gafi fala isso, claramente, não foi suficiente, ela têm deficiências graves. Precisamos, então, revisar esta Lei. Existe um Projeto de Lei, apresentado no Congresso e, agora, é claro, nós estamos falando de tempos parlamentares. Com apetite parlamentar, o grau de negociação do Governo com o parlamento, então, provavelmente, o que a gente espera é que, isso seja resolvido o quanto antes, até para atender às exigências do Gafi. O Brasil é um grande ator no cenário internacional e não quer ficar de fora destas medidas, desta luta, contra o financiamento do terrorismo e à lavagem de dinheiro. Então, é difícil calcular porque não fez e quando fará. Porque não fez, não fez!  O que nós temos que olhar, o que eu acredito que nós temos que esperar, é trabalhar forte para que resolvam as deficiências, aprovando o Projeto de Lei. Este Projeto é o grande Projeto em relação a esta temática. Até porque, este Projeto foi desenvolvido para buscar resolver àquelas deficiências identificadas na Lei 13.170. Então, ele, basicamente, refaz toda a lógica das medidas a serem adotadas para o congelamento, toda dinâmica de como deverá ser feito. Quem faz o quê, o papel de cada órgão, e sana àquelas deficiências. Ou seja, ele não exige mais que se tenha um decreto presidencial, a partir do qual, se cumpre a obrigação que está prevista na Resolução, e nem a homologação judiciária. Você espera que as medidas sejam medidas cautelares preventivas, é claro, quando se fala em medidas de congelamento, você está falando de medidas de indisponibilidade dos bens daquelas pessoas, que são suspeitas de estarem vinculadas a grupos de terroristas ou de serem terroristas. São medidas cautelares, portanto, você não tira propriedade dos bens daquela pessoa, no entanto, se tornam indisponíveis para aquela pessoa. Por exemplo, se for dinheiro, ela não vai poder transferir, sacar, depositar, fazer nada com aquele montante. Então, a ideia é esta. É claro que, se houver o devido processo legal, certamente, o Judiciário será invocado, como qualquer processo, em relação a qualquer outro delito, não há dúvida quanto a isso. Então, ele está a um passo à frente em relação à Lei, como ela está, a 13.170.  Ele, por exemplo, garante mais agilidade, em primeiro lugar, que se cumpra a obrigação prevista na Resolução, por um meio cautelar ainda num ambiente administrativo, e em terceiro, a possibilidade de se criar as listas nacionais de terroristas, assim claro, respaldadas por provas robustas, dentro do processo, que amparem aquela decisão de se incluir na lista. Então, eu acho que este projeto, ele, realmente, traz bastante inovações em relação como estava a Lei 13.170.

IPLD: A redação como está proposta, a forma como ela foi proposta, na sua visão, ela atende aos requisitos globais de prevenção ao financiamento do terrorismo?

Prof. Dr. Jorge Lasmar: Ela não é voltada para criar uma legislação de prevenção ou de combate ao financiamento do terrorismo. Ela é um Projeto de Lei que está voltado à execução das resoluções do Conselho de Segurança, voltados para o combate ao financiamento do terrorismo e, principalmente, mais especificamente, das listas de congelamentos de bens e ativos das pessoas designadas. É importante fazer esta diferença, mas neste aspecto, conforme o Bernardo mencionou, ela avança bastante em relação à nossa legislação anterior. Ela menciona, expressamente, que os bens devem ser congelados em questão de horas, e essa é a expressão que o Gafi usa, “em questão de horas”. Ela permite, que além das listas internacionais, que outros governos, outras autoridades, também possam pedir este congelamento ao Brasil, então, este também é outro ponto de atenção que o Gafi havia levantado e ela aborda, especificamente. A questão da criação da lista nacional. É uma legislação que já prevê os procedimentos administrativos, o aviso da Polícia Federal, em relação as questões das fronteiras, a Comissão de Valores Mobiliários, os bens, etc.

 

     
   

Então, acho que ela responde bem ao que se tem solicitado ao Brasil, que diz respeito à execução destas resoluções do Conselho de Segurança.

   
     

 

IPLD: O Projeto de Lei 10.431, de 2018, da forma como ele foi apresentado, ele tem condições de passar desta maneira, ou ele vai sofrer muitas alterações em relação à redação original?

Bernardo Mota: Ótima pergunta, eu estou acompanhando de perto a tramitação e a negociação do Projeto no Congresso. Ele é um Projeto encaminhado pelo Executivo. Eu participei, na época da elaboração do Projeto, participei da negociação dele, participei, praticamente, de todas as etapas, enquanto ele esteve no Executivo e, agora, acompanhei no final do ano passado, em 2018, a tramitação no Congresso e, tenho acompanhado de perto, com o apoio da assessoria parlamentar do Ministério da Justiça e Segurança Pública. É difícil fazer um cálculo, a gente nunca sabe o que pode acontecer, mas posso dizer o seguinte, da forma como ele foi apresentado ao Congresso, na medida em que nós vínhamos acompanhando as instruções, a ele foram apresentadas várias emendas, vários substitutivos, várias tentativas de obstrução de pautas. Isto dentro da dinâmica do Congresso, que é absolutamente soberano para fazer estas discussões e, é assim que tem que ser, é a Casa do Povo, as discussões têm que ser as mais variadas, e isso é absolutamente legítimo. Mas, o que nós vimos, pelo menos na nossa avaliação, considerando que o Gafi já havia, mais ou menos, feito uma pró-análise no Projeto 10.431, da forma tal como ele foi encaminhado e já tinha sinalizado que ele estava adequado, entendemos que o ideal seria não mexer, até para agilizar a aprovação e, o quanto antes, cumprir os prazos que o próprio Gafi nos estipulou.

 

     
   

Então, o ideal seria que ele fosse aprovado assim, porque já tinha a chancela técnica do Gafi

   
     

 

Mas, é claro, dentro do Congresso, as discussões são variadas, as visões são variadas, e foram apresentadas as propostas de emendas. Muitas delas, fazendo uma análise, comparando com o que é o cenário internacional, e da forma como o Gafi exige, eu achei que não eram adequadas, não melhorariam o Projeto, muito pelo contrário, tornariam ele mais pesado, emperraria, um pouco, a dinâmica como ela está prevista.  Outros tentaram incluir mais algumas questões, ou por exemplo, derrubar a questão da medida cautelar administrativa e voltar para decisão judicial, isso o Gafi já disse que não é adequado, isso seria absolutamente  inoportuno para este Projeto. E outras discussões, algumas coisas relacionadas a ajustes de termologia, dentro da técnica legislativa de quando se faz um Projeto de Lei, o que são absolutamente legítimas. O que nós entendemos, é que este Projeto, e isso o Gafi tem falado o tempo todo, e o Executivo está absolutamente ciente disso, temos que aprovar o quanto antes.  Então, o quanto menos discussões houver, quanto mais rápido ele for aprovado, melhor para nós, do ponto de vista do cumprimento em relação aos prazos estipulados e acordados entre o Gafi e o Brasil. Então, o ideal seria que ele fosse aprovado do jeito que ele está. Já houve, quer dizer, este Projeto saiu do Executivo com todas as chancelas das consultorias dos ministérios envolvidos, portanto, teve uma análise jurídica de mérito, de constitucionalidade afundo, dentro deste Projeto. Todos foram unânimes com este texto. Ele tem esta chancela internacional do Gafi, então, entendemos, da forma como ele está, o ideal seria que ele fosse aprovado assim. É claro, que nós não podemos garantir que assim será, mas o ideal, e o Executivo irá fazer todas as gestões com o Congresso Nacional, para que ele seja aprovado do jeito que está, ou que seja alterado o mínimo possível, para que não descaracterize estas questões que o Gafi já apontou como sendo adequadas.